terça-feira, 21 de maio de 2013

Sobre o filme canadense de Philippe Falardeau que concorreu ao oscar: O que traz boas novas.


Devo admitir que me agradam os filmes focados no seu universo particular. Que se atêm aos fatos dentro da narrativa central e nesse trajeto encontram uma brecha para abranger muito mais.
O que quero dizer com isso?

O que traz boas novas é um filme que toca em muitas questões sem necessariamente desenvolvê-las a fundo. Já no começo, quando o professor Bashir Lazhar, nosso protagonista, entra em sala de aula e inicia a chamada, a questão da mistura de origens, do passado cultural indicando um possível histórico de imigração das famílias daquelas crianças é exposta somente pela leitura de seus sobrenomes.

Bashir está em meio a um processo para tentar ser aprovado como refugiado e, assim, não ter mais que retornar ao seu país de origem, a Argélia.

Existe indicações de algum segredo em torno da vida pessoal de Bashir, que mais tarde nos é revelado, mas de maneira sutil, sem grandes dramas, sem flashbacks, sem mão pesada de uma tentativa de falar mais a fundo sobre a Argélia, ou o que teria levado à sua partida de lá. Esta paisagem histórica, esse pano de fundo que contextualiza sua motivação, deixa em pauta uma situação Argelina desestabilizada nos dias de hoje.

A Argélia e sua cultura, estão impressas subcutaneamente em sua maneira de ser, em suas lembranças, em sua maneira de ver o mundo. Tão enraizado, que nem percebe ou mal consegue evitar manifestações da mesma, como o início de passos de uma dança típica de seu país ou um tapa no pescoço de um dos alunos, quase ato reflexo de um modo de se portar bastante diferente do aceito em seu novo local de residência, o Canadá.

Esse evento traz à tona uma outra questão bastante pertinente do filme:
a proximidade na relação professor-aluno e o fato de que aquele país, assim como vários outros hoje em dia, não permitem o toque, a intervenção física de qualquer tipo, seja pelo carinho, seja pela repreensão.

As crianças são retratadas de forma bastante amadurecida. Falam, agem, olham e sentem como indivíduos em formação. Inocentes às vezes e carentes de determinadas palavras de ordem e direcionamento, mas nem um pouco ingênuos em relação a suas emoções. Não costumo ver isso no cinema. Não de uma maneira equilibrada aonde a criança mantem o caráter infantil (diferente da versão adulta “assustadora” de Dakota Fanning), mas é respeitada como um indivíduo em toda sua complexidade e opiniões.

Um dos diálogos mais marcantes é de Bashir com os pais de uma das alunas, quando dizem que ele deve ensiná-la, não educá-la, indicando bem essa diferença de valores e o limite de “envolvimento” que se espera de um professor. 
A dureza e a rigidez são postas em questão pelo próprio personagem e qualquer tipo de evolução em direção a um comportamento mais carinhoso mantem o padrão da sutileza, sem grandes arrebatamentos cor de rosa ou sequências musicais tão presentes em filmes de “professor aprende com os alunos e vice e versa”.

A vida pessoal de Bashir, os flertes com uma das professoras, os seus temores como imigrante em situação instável, os pesadelos em decorrência dos eventos na Argélia fazem parte da construção do personagem e são mostrados de maneira fluida, mesmo que pontualmente. Nada daquilo o define em si e nenhum desses movimentos se quer predominante no filme. Todos confluem para essa construção igualmente.

E finalmente, a morte, a maturidade daquelas crianças, a ambiguidade do caráter da professora que se suicida nas cenas iniciais do filme são outros temas abordados. A vida pessoal da professora e uma possível depressão é mencionada, mas nunca aprofundada. O marido não ir buscar a caixa com suas coisas é mais um dos elementos que ajudam a construir, mas não definir.

Nada é fato. Tudo é impressão, subjetividade. Adoro filmes assim. Abertos, não por um capricho ou por falta de consciência de para onde devem seguir, mas simplesmente porque é o que cabe neles. Nada se resolve realmente. A vida segue com os pais ausentes de Simon, com as regras de conduta questionáveis, com a mãe de Alice viajando sempre, com as dores de cabeça de Boris e com a impossibilidade de Bashir de continuar. Eles fazem o que lhes é possível, naquele momento, naquela cena.

Em termos técnicos, mesmo que de leve:
 as cores neutras, quase sempre pendendo pro azul sustentam o clima em suspensão do filme. Um azul de frio intercalado brevemente pela impressão de verde mencionada pelo protagonista.
As atuações são ótimas, sobretudo Mohamed Said Fellag e algumas das crianças, como Émilien Néron e Sophie Nelisse.
Assim como a narrativa, tecnicamente não há nada de exagerado. Sem floreios musicais, ou planos estilosos, nem mesmo aquela estética do real com câmera na mão tremida. A edição também é precisa, a duração das cenas é exata, com destaque à sequência de abertura e à cena do desabafo de Simon na sala de aula.


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Salvem a KODAK


De todas as notícias assustadoras que vislumbro no jornal todas as manhãs, uma das que mais me assustou foi a da possível falência da maior empresa de filme negativo do mundo.
Não queria entrar nos méritos da “notícia”. Mas já entrando… com seu título sensacionalista ou simplesmente determinista, em que o jornalista parece decidir o destino antes mesmo de decisões serem tomadas (O fim de um era.). Não há dúvida na frase. Um ponto seco. Tot.
Eu não quero nostalgia. Não quero linhas do tempo ressaltando os bons momentos desta “doce jornada”, ou entrevistas com fotógrafos que dizem sentir pena de ver esta grande empresa saindo de suas vidas. Ela, que cresceu com eles e lhes proporcionou tantos conhecimentos antes da era digital vir para solucionar todos os problemas. (rhm rhm, não)
Impressionante como tudo depende do enfoque que se dá né? Publicitários e jornalistas são os que mais usam e abusam desta categoria.
O jornal de hoje, através de sua folha inteira com notícias relacionadas ao “fim da era”, traz como motes duas premissas, que ficam na cabeça no leitor como certezas: 1 - já acabou. 2 – quaisquer vestígios de pena e nostalgia são compreensíveis, mas as pessoas “devem” entender que é apenas isso, porque como o fotógrafo entrevistado diz, a fotografia digital veio para resolver tudo.

Cheguei ao ponto que queria, discutir a validez deste argumento tão raso, mas tão repetido como mantra: a era digital é uma evolução da era analógica.
Isso é uma grande besteira.
Não sou anti digital, não tenho nada contra o surgimento de novas técnicas. Pelo contrário, quanto mais possibilidades, melhor para o usuário. O que nego é a crença completamente injustificada de que o digital veio para suplantar o analógico, por ser melhor, ou mais eficaz.
São duas maneiras DIFERENTES. De fazer, de se chegar aos resultados, de experienciar.
É completamente diferente ir ao cinema e assistir um filme no computador, assim como é diferente ouvir um vinil e um mp3, ler um livro ou um e-book e fotografar analogica ou digitalmente.
Os rituais são diversos, os tempos, o manejo, as expectativas, etc.
Sem contar com uma das melhores coisas, a qualidade. Fita K7, vídeo, dvd, cd, disquete, bla bla bla. Tudo isso vem e vai, mas os bons e velhos vinis e películas permanecem sendo as maneiras mais fiéis de se registrar e, sobretudo, confiáveis de se guardar informação. São processos materiais, que dependem apenas de processos físicos e químicos, mágica que acontece diante de nossos olhos.
Não estou dizendo para voltarmos a escrever em máquinas de escrever. Mas que exista essa possibilidade pra quem quer.
Sei que vivemos num mundo capitalista e que a KODAK, assim como outras empresas, devem seguir as regras de demanda e oferta e toda essa idiotice que a gente finge fazer sentido. Mas se existe a chance dela continuar, através de um perdão das dívidas, que seja com apoio de pessoas como nós, que seja com torcida organizada, que seja com ajuda, com dicas para solucionar.
É possível pensar que deve ter sido difícil conformar os gastos de uma empresa deste porte, com o baque que sofreu e numa velocidade tão rápida quanto foram os últimos vinte anos.
É preciso pensar em medidas. Usar lucros de outras áreas (impressoras, as próprias máquinas digitais) para sustentar os gastos dos filmes, por exemplo. Sectorizar, criar novos mecanismos de escoamento da produção. Fazer parceria com a LOMO, que aumenta suas vendas cada vez mais, e tudo através de um pensamento de estilo de vida analógico. Tudo isso e muito mais pode fazer parte de um plano de recuperação. Não quero caridade para a KODAK. “coitadinha, vamos levar pro abate ou dar uns aninhos de vida”? NÃO!
Quero que se entenda que pra muitas pessoas essa tecnologia “antiga” faz diferença, uma grande diferença. Que algo que provou seus resultados tantas vezes merece apoio, merece a chance de ser (re)conhecido pelas próximas gerações.

Há certas coisas que valem a pena salvar! There are some things worth saving. Admito que o uso hoje em dia é quase irrisório em comparação a quantidade de filmes vendidos antes. Claro, hoje em dia a maioria das pessoas têm máquinas digitais. Muitos jovens nem nunca usaram uma câmera analógica. Como também, muito estão se interessando e indo atrás das velhas tecnologias, seja pela experiência, seja pelo movimento hipster, por curiosidade, por nostalgia, ou simplesmente por acreditarem que os produtos antigos e algumas de suas técnicas possuem não só características diferentes, que possibilitam outros resultados, como têm uma resistência ao tempo muito maior. “Feitos pra durar”
Não há porque uma coisa acabar com a outra. Elas devem conviver.
Não vamos deixar que a pressa, a necessidade (inventada) de resultados rápidos e a vontade de custos mais baixos acabem com a nossa liberdade de escolha (no plano simbólico) e com uma das maiores representantes dessa técnica fantástica (no plano prático).

domingo, 24 de abril de 2011

Passeando por Buenos Aires

Fui uma das últimas pessoas que conheço que resolveu se render a tentação de ir a Buenos Aires. No início de março resolvi aproveitar que tinha duas amigas estudando lá e convenci minha mãe a fazer esse passeio comigo.

Sinto-me envergonhada de dizer que, aos 24 anos, este foi o primeiro país da América Latina que visitei. Bom, nunca é tarde pra começar.
Depois de 10 dias de viagem, das inevitáveis compras e de muito andar e fotografar, tenho algumas recomendações para aqueles que, mais tardios do que eu, pensam em aproveitar o baixo custo de cruzar a ponte Brasil Argentina.

Algumas das dicas mais comuns são: a Praça de Maio, onde fica a casa Rosada; o Caminito; San Telmo e Palermo; Tigre; Galerias Pacífico; Café Tortoni; Livraria El Ateneo; O Museu MALBA; a Rosa; …

Todos foram interessantes. Uns mais do que outros. San Telmo, por exemplo, foi um de meus bairros favoritos pra andar. O dia mais indicado é aos domingos, quando há uma feirinha super legal, cujo centro parece a nossa Feira de antiguidades da Praça XV e as extremidades já contêm produtos mais atuais, coisas muito interessantes, frequentemente artesanais que você só vai encontrar lá. Mas independentemente, este é um bairro agradável em qualquer dia. Para os cinéfilos, a Universidade del Cine fica numa das ruazinhas deste bairro e passa gratuitamente filmes todas as quintas feiras a noite. Ah! e a estátua da Mafalda sentadinha, muito graciosa também se encontra numa dessas ruas.
Enquanto San Telmo lembra um pouco a Lapa e Santa Teresa, Palermo seria a Ipanema de Buenos Aires. Cheia de lojas cool, com roupas e sapatos lindos, restaurantes estilosos e pessoas bonitas, este bairro é uma perdição pra quem quer fazer compras e também oferece uma feirinha, só que aos sábados.


Um restaurante muito bacana é o Moo, que tem todo um clima anos 50 e milkshakes incríveis! A loja de sapatos e bolsas Puro (Jorge Luis Borges 2184-Guatemala and Paraguay-zapatillaspuro.com.ar) também é uma boa.
Há também uma lindíssima papelaria em Palermo (Papelera Palermo) – Calle Honduras 4945, repleta de material para aqueles interessados em fazer seus próprios cadernos ou estampas. Para os que vão permanecer vários dias, a papelaria oferece oficinas para aprender técnicas de pintura, encadernação, etc.
Há muitos festivais de cinema e de música rolando o ano inteiro. Quando eu estava lá, havia o 2o Festival Independente de Tango. No último dia, fizeram uma milonga ao ar livre após o término da feirinha de SanTelmo. Vários pares desconhecidos se formaram imediatamente pra bailar o Tango.


Além disso, se você quer dançar, há muitos locais diferentes todos os dias em diversos horários que oferecem aulaspor uma média de 20 pesos por dia. Um site que pode ajudar nisso é http://www.buenosairesmilongas.com/
Eu, por exemplo, assisti uma aula de bebop, muito bacana.
Atrações como a Praça de Maio, Tigre, o Caminito, as Galerias Pacífico na calle Florida, a Livraria El Ateneo, O Museu MALBA e a Rosa são tranquilamente condensadas em atividades paralelas de dois três dias.
El Ateneo é realmente linda, mas uma livraria cara. Por isso recomendo olharem os muitos sebos da Calle Uruguay (próximo a estação de Metrô Uruguay).
A Recoleta, onde se encontram a Rosa e o Malba é um bairro bastante residencial sem muitas opções mais econômicas de lazer. Se assemelha um pouco ao Leblon no quesito caro e chique.
 


Já o Caminito foi um lugar ótimo para comprar lembrancinhas, mas o clima turístico é um pouco opressor. Há restaurantes por toda a rua com pessoas te chamando o tempo todo pra sentar e assistir, seja o Tango ou as apresentações de outras danças típicas.
As Galerias Pacífico lembram as Galerias Lafayette, em Paris. Lindo por dentro, mas bastante caro.
Já a Calle Florida oferece todo tipo de produto que variam entre preços justos, mais baratos do que no Brasil ou caros ainda assim. Os vendedores ambulantes espalham seus produtos ao longo da rua a partir das 4 horas da tarde mais ou menos, todos os dias. Vale a pena conferir.
O famoso Café Tortoni é realmente um local agradável. Por incrível que pareça, não é muito mais caro do que o normal. Ótimo para tomar um chá ou comer um pedaço de quiche. Os garçons são super ágeis e prestativos. 

O charme do local é irresistível, então não se preocupem, eles estão super acostumados com pessoas entrando para tirar fotos.
Já em relação a Tigre, pode-se chegar pelo trem normal, por menos de 3 pesos. Quando se chega lá você tem a opção de passear de barco ou catamarã, ou de ficar e aproveitar a feira do Porto das Frutas. Ambos passeios interessantes. 


O mais legal mesmo é andar, pegar onibus, conhecer a cidade e seus cantos.
Um dos melhores dias foi quando encontrei alguns argentinos e depois de conversarmos num bar em um bairro chamado Almagro, fomos a um clube assistir uma Peña (tem um sentido parecido de uma milonga, mas com danças e ritmos regionais de outras parte da Argentina). As danças eram lindas e o clima ótimo. Todos nós fomos super bem acolhidos.
Em geral minhas dicas são essas. Espero que tenha interessado tanto aqueles que nunca foram quanto aqueles que querem fazer uma nova visita. 





 

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Graffiti

Bom dia!
enquanto escrevo sobre "Amor e outras drogas", deixo aqui algumas fotos de graffitis. Estou numa fase bastante deslumbrada pelas intervenções urbanas. Espero que gostem.



sábado, 29 de janeiro de 2011

Em Algum Lugar - Sofia Coppola

Parece haver um interesse em comum nos últimos filmes de Sofia: a desmistificação de certos símbolos. No caso de Maria Antonieta o interesse era mostrar que por trás do título de realeza e dos livros de história, a personagem mulher era mais complexa e sua vida continha mais do que algumas falas lendárias. Não vou entrar no mérito deste filme inteiramente e apenas dizer que, assim como em Somewhere, acredito que Sofia falhou e exagerou em seu intuito de subverter os valores estabelecidos.
“Em algum lugar” narra através de sequencias longas e um tanto entediantes alguns dias na vida de um famoso ator de Hollywood. Stephen Dorf interpreta Johnny Marco, que parece estar em meio ao período de divulgação de seu mais novo filme e disfrutando de diversas regalias, tais como um carro esporte, uma assessora que o telefona sempre que há algum compromisso, viagens pagas, estadia num hotel luxuoso e exclusivo, etc.
O filme é dividido em dois momentos, um prólogo de introdução ao personagem, onde presenciamos sua entediante existência e o período em que sua filha de 11 anos fica hospedada com ele. As três primeiras sequências do filme, uma antes dos créditos e duas logo depois já nos dão de bandeja informações que servirão como base de todo o resto. Na primeira, Johnny gira em círculos com seu carro numa estrada deserta, quase como numa metáfora de sua vida, que não o está levando a lugar nenhum, que é apenas um girar sem propósito. Logo depois, temos a cena em que Johnny machuca o pulso, levando-o ao gesso no braço que o acompanhará por quase toda a narrativa, também possivelmente uma metáfora deste imprisionamento, desta condição transitória, e a cena das gêmeas loiras dançando uma coreografia sexy para Johnny enquanto este adormece. É isso. Nestas três cenas temos um resumo bastante preciso do que veremos no resto do filme: tédio e banalidade que tentam ser mais do que isso.
Acho bacana esta motivação de apresentar um ator de Hollywood como apenas mais uma pessoa, com questões semelhantes as de qualquer um e de subverter a crença de que por este ser rico e rodeado de mordomias, seria uma pessoa feliz e completa. Nem mesmo interessante ele é. Sofia quer mostrar que não existe o glamour que as pessoas pensam. É uma vida bastante vazia. E solitária. Por mais que haja uma mulher por dia, pelo menos, se oferecendo a ele, no fim da noite, ele está sozinho novamente. Até sexo se tornou desinteressante para esta personagem.
Ok. Tais motivações ficaram claras, mas a que custo?
O tempo narrativo vagaroso, os planos sem conteúdo e os diálogos banais dão forma a este tédio ensurdecedor do filme, que diferente de “Encontros e Desencontros”, não encontra nenhuma inspiração, nenhum tom de profundidade ou de aprendizado.
Além disso, outra questão que me incomoda bastante é o fato destes personagens serem tão desinteressantes. Não há carisma, não há nada que realmente mantenha o espectador na poltrona querendo assistí-los. E a tentativa de dar profundidade psicológica aos mesmos e de igualar seus problemas e inquietações aos de qualquer um não convence. Dá quase vontade de rir, quando a filha de Johnny chora e demonstra inseguranças e para lidar com isso ele vai para Las Vegas. “Tudo bem se atrasar um pouco, porque é só chamar um helicóptero pra buscá-los depois”. Essa posição de coitadinho não cola. As cenas e as atuações são rasas demais para que eu me comova com este ator entediado em seu carro esporte.
A relação de pai e filha, que deveria ser o ponto de transformação é levado a um nível tão banal que não possui a força necessária.
Alguns dos melhores momentos são os de interação deste ator com o cotidiano esdrúxulo relacionado a profissão: o programa de TV italiana, a conferência de imprensa, o molde para efeitos especiais, as fotos de promoção com sua colega de trabalho no filme, etc. Nisto, acho que o humor e a ironia ainda são um ponto forte da roteirista.
Quase tudo no filme pode ser justificado ou interpretado em um campo simbólico. Mas isso não o torna um bom filme. Apenas coerente.
A última cena ilustra bem a personagem, que parece saber que está sendo filmada e se comporta como num filme. Sai do carro no meio de uma estrada pois está deixando tudo pra trás, está indo se encontrar, está se livrando das amarras e das certezas, todos estes possíveis clichês.
Por essas e outras, é um pouco decepcionante ver como a diretora regrediu desde “Encontros e Desencontros”, que deveria ser uma evolução, já que foram escritos ao mesmo tempo e possuem temas tão próximos.
Ainda assim, acredito em seu potencial e fico ansiosa para descobrir um outro bom filme seu.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Festival do Rio 2010 - parte 2

Copacabana
Nome estranho para um filme francês… Diferente de possíveis expectativas, o título vem de um fascínio da personagem central, interpretada por Isabelle Hupert, por músicas brasileiras.
Um “feel good movie”, um filme “safe”, que não corre riscos. Conta a história de uma mulher nos seus 50 anos, que depois de ter viajado bastante, vivido muitas histórias e conhecido muitas pessoas, se vê no momento de conseguir um emprego para, dentre outros motivos, ser levada a sério por sua filha de 20 e poucos anos, que depois de ter vivido todo este tempo se deslocando, quer estabilidade e segurança e se possível, distanciar-se ao máximo dos modos liberais e espalhafatosos de sua mãe. É uma simples inversão de valores: a mãe, protótipo da ex hippie, que se veste alternativamente, deve dinheiro aos amigos e que não sabe lidar bem com responsabilidades, em oposição a filha, conservadora, que vai se casar com um cara certinho e que se sente envergonhada de ter uma mãe assim.
Chega o momento então de Isabelle Hupert provar para sua filha que pode ser uma pessoa responsável, confiável e que consegue manter um emprego por mais de uma semana. Para isso, acaba passando um pouco por cima de certos valores, mas de seu jeito se adapta a nova vida.
É bom ver um filme leve, de comédia com essa grande atriz francesa, que acaba muitas vezes presa ao esterótipo de papéis pesados e dramáticos.
A visão do Brasil segue deturpada e idealizada, como em tantos filmes estrangeiros, e o encaixe da trilha sonora na montagem, por sinal cheia de canções brasileiras ótimas, é um tanto deslocado, mostrando que apesar de haver um interesse, não há grande entendimento da nossa cultura.
Mais um filme francês que eu encaixo na categoria “Simpáticos” e que oferecem boa distração.

Cópia Fiel - isto é apenas uma pincelada no que pode ser dito sobre este filme.
Filme mais recente de Abbas Kiarostami, pelo qual Juliette Binoche ganhou o prêmio de melhor atriz em Cannes, “Copie Conforme” como no original, envolve uma série de questões e possíveis reflexões, embaladas por atuações fantásticas, timing delicioso entre silêncios e falas, desenvoltura na relação entre os personagens, uma decupagem precisa e escolhas estéticas de luz e enquadramentos maravilhosas. Ainda preciso assistí-lo mais vezes para poder explorar melhor os temas abordados, mas de forma rasa, posso apontar a questão mais óbvia, tema do livro do ator masculino central: a arte e a relação entre a cópia e o original, que também acaba abordando a questão de autor e de gênio. Além disso, temos uma lenta transformação da relação dos personagens que acaba confundindo o espectador, que se perde entre invenção e realidade. Não sabemos mais se o que está acontecendo é um jogo entre os dois ou algo que não nos foi revelado. De qualquer forma, isto não parece ser algo importante e sim o simples fato desta mistura ser possível através do cinema. Que me traz a outro tema: ficção e documental, linha esta que sempre atraiu Kiarostami em sua forma de construir os filmes: seja através da escolha de não atores, ou da improvisação, ou o uso de câmeras digitais e o aspecto cru e espontâneo da imagem, ou o aparecimento da equipe de filmagem na tela, ou até mesmo o tema que parece forçar esta barreira, a obra de Kiarostami sempre esteve no limiar destas duas linguagens, nos mostrando que é impossível saber o que é real ou não e até mesmo que não existe o real, existe apenas representação.
Além de todas as questões, pode-se dizer, filosóficas, há a simples, que de simples não tem nada, relação entre o homem e a mulher, que parece ser a mais intrigante e misteriosa do filme.
Todos estes aspectos, combinados com os elementos técnicos que mencionei antes, se juntam para formar um filme excelente e delicioso de se assistir.

Cortina de Fumaça
Pode se dizer que o filme se divide em duas partes. A primeira metade é um estudo detalhado sobre o histórico e as diversas funções da Canabis, planta que dá origem a maconha. Desde seu uso religioso passando pelos medicinais e aos mais comerciais, esta seção do filme tenta desmentir certos mitos em torno da maconha, desbancando-os um por um e mostra que ela não apresenta tantos riscos e malefícios, como costuma ser divulgado na mídia. O filme mostra também que a planta faz parte da história do homem e chega a revelar que temos até mesmo uma parte do cérebro, de nossas ligações nervosas, voltada diretamente para receber impulsos da droga. Enfim, é interessante, mas em dado momento, a edição se concentra numa feira de produtos extraídos da canabis e o filme se prende a um lado da comercialização de seus subextratos por bastante tempo. Mais interessante é vermos médicos defendendo a planta como benéfica em diversos casos de doenças como câncer, dentre outras.
Curiosidades de lado, a conclusão desta primeira parte é que quase nunca temos todas as informações necessárias para julgarmos algo como bom ou ruim. Além disso, nem sempre esta, que é considerada uma droga prejudicial, apresenta realmente apenas malefícios para o homem. Ressalta-se também que, como muitos sabem, a maconha não apresenta riscos de overdose, não mata neurônios e causa bem menos danos que drogas legalizadas como o álcool ou o cigarro.
A partir daí, passamos para a segunda parte do filme, onde entramos numa discussão mais centralizada, que concerne o Rio de Janeiro, o Brasil e a legalização das drogas. Através de entrevistas com advogados, policiais, médicos e especialistas em geral, temos um panorama de diversas áreas e suas posições em relação ao sistema de proibição que vivemos hoje. Mais uma vez temos uma contextualização histórica interessante, que mostra o estopim da Guerra as drogas, iniciada por Nixon nos Estados Unidos nos anos 60. Acompanhamos a falta de informação por parte da mídia e a hipocrisia na forma de lidar com o tema, não só em nosso país como ao redor do mundo.
Podemos concluir instintivamente que dentre aqueles que não apóiam a legalização das drogas, existem as pessoas que têm medo do desconhecido, aquelas que lucram ou se beneficiam de certa forma com a proibição e as mais conservadoras que não querem nem ouvir falar do assunto. Infelizmente o filme não apresenta estes pontos de vista, que poderiam gerar uma discussão interessante e um confronto de argumentos, tanto favoráveis quanto desfavoráveis. Por ser unilateral e defender apenas o ponto de vista “liberal”, ele se apresenta como um manifesto, político e social, que se pretende como porta voz de uma mudança necessária no nosso modo de encarar o tema e se possível, um porta voz de mudanças no próprio sistema.
Para defender a liberação, temos argumentos como o de:
Liberdade de escolha – quando o dano é individual, cada um deve poder escolher o que fazer consigo mesmo.
O absurdo que é a situação em torno da legislação das drogas – quase sempre quem é preso são os bandidos menores, que superlotam cadeias e são facilmente substituídos na cadeia alimentar do tráfico. Sem contar que essas pessoas, quando soltas, não possuem nenhuma perspectiva de sair desta vida.
A maconha como principal foco do tráfico – sabe-se que a maior parte do consumo de drogas aqui é a maconha, que como demonstrado na primeira parte, não é esse bicho de sete cabeças. Os outros tipos são consumidos por cerca de 2% da população mundial e é um pouco absurdo criar legislações tentando controlar o que estes 2% fazem, ainda mais, em detrimento deles mesmos e não de outros.
A conclusão de que do jeito que está não dá – a luta entre polícia e traficantes é uma maneira injusta, cruel e ineficiente de conter os danos causados. Além disso, as próprias UPPs, que parecem apresentar uma forma um pouco melhor de combate, sem o uso excessivo da violência, é uma medida muito concentrada em favelas da Zona Sul.
Etc…
Não acho este assunto simples e não acredito em uma solução fácil, mas concordo que do jeito que está não dá. Ficar insistindo no erro não vai nos levar a lugar nenhum. Por isso, espero que o filme seja visto por muitos e possa gerar democratização da informação e debates e quem sabe, até propostas de mudança.

Curling
Denis Coté foi eleito por mim como o melhor convidado do Festival. Simpático, tranquilo, autosuficiente, engraçado e aberto para conversas de bar, Denis fez sucesso entre aqueles que trabalharam comigo no hotel ou pessoas do receptivo, que o acompanharam em suas atividades diárias. Conversamos sempre em francês. “Tenho que ter cuidado pra não falar rápido demais, senão você não vai entender nada” – disse ele me prevenindo de seu sotaque canadense de Montreal.
Aprendi um pouco sobre o panorama do cinema canadense, que aparentemente produz bastante, considerando o tamanho de seu país, ou melhor, de sua área, porque existe claramente, segundo ele,  uma divisória entre a parte francofônica e a anglofônica.
Frequentador de festivais assíduo, Denis já viajou pra diversos países, mas era sua primeira vez no Brasil. Alto, com tatuagens em ambos os braços e bem branquinho, não se incomodou com o tempo fechado. “Não sou do tipo que adora praia.” Em contrapartida, se encantou em conversar sobre futebol bebendo cerveja Antartica no baixo Botafogo com autênticos brasileiros.
Mas vamos ao filme.
Curling é seu sexto longametragem e aquele que mais demorou para fazer. Os outros 5 foram realizados em 5 anos total e este demorou 3 anos desde o roteiro até ser finalizado. Denis diz não saber muito bem de onde sai a inspiração para escrever. Ele tem uma idéia meio solta e começa a desenvolver daí.
Basicamente o filme fala de dois personagens, pai e filha, que vivem a margem da sociedade. Pessoas alheias ao mundo que não sabem se relacionar muito bem com o que lhes é externo. A filha não vai a escola e é educada pelo pai, por isso não tem amigos. O pai é um homem calado, que trabalha num ringue de boliche.
Denis disse que, sendo um país muito frio, em que durante os meses do inverno quase ninguém quer sair nas ruas e um clima de tédio se instala, o Canadá é cheio dessas pessoas, que parecem se esconder em suas casas. Ficou intrigado com isso e resolveu criar algo em cima desta premissa.
O filme cria muito bem essa noção de distanciamento da realidade, através de seu timing, da troca entre silêncios e diálogos, da forma fria com a qual a menina fala da mãe chamando-a pelo nome (Rosie), dos estranhos rituais que os personagens mantêm em seus cotidianos, das atuações fantásticas dos dois que passam inexpressividade e quase indiferença através do olhar. Além disso, o filme nos oferece elementos de estranhamento que podem ser interpretados de diversas maneiras. Essa multiplicidade de interpretações e até mesmo a diversidade de gostos é algo que agrada Denis. “Eu adoro quando vejo que as pessoas estão pensando em coisas completamente diferentes sobre meu filme. Se em uma platéia de 200 pessoas, todas estiverem batendo palmas no final, aí sim temos um problema. Isso não seria normal.”
Ao longo do tempo, os personagens vão passando por mudanças sutis até chegarem a uma certa urgência de se aproximarem do mundo lá fora. Me agrada muito a autenticidade com a qual ele consegue tratar deste tema ligeiramente convencional (mudança do personagem) - através de um processo que é mostrado de forma delicada, ao mesmo tempo que estranha. Os planos e a fotografia em geral são lindos e bastante conscientes. A segunda cena, com os dois andando na beira de uma estrada enquanto neva muito é linda demais.
Tentei falar mais sobre o clima do filme e não de sua história, porque creio que é o ambiente que consegue passar a sensação de isolamento, mais do que qualquer coisa.
É um filme intrigante, com escolhas visuais marcantes e um tempo narrativo interessante, que merece ser visto.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Festival do Rio 2010

Chegou a hora de fazer uma revisão geral dos filmes do Festival. Por estar trabalhando no evento, e em decorrência disto, acordando as 6 da manhã quase todos os dias, não pude enviar um recorte diário atualizado, como muitos o estão fazendo com o Twitter.
É uma pena, por não poder indicar certos filmes a tempo que vocês possam ir, mas… é sempre tempo para procurarem, seja para assistir no cinema mais tarde quando estrearem, seja para alugar, ou baixar na internet.
Costumo colocar os filmes do Festival em categorias, para facilitar o trabalho, já que assisto em torno de 50 filmes.

Filmes Relaxantes . Filmes de Festival . Filmes Esquisitos . Filmes Simpáticos . Documentários...

Começo por um filme simpático:

“8 vezes de pé”, francês, é o primeiro longametragem de Xabi Molia. Misturando comédia e drama, tenta tratar com uma certa leveza a difícil vida de Elsa, que não consegue se integrar as necessidades do mundo cotidiano. Passa por situações um tanto quanto preocupantes: seja sendo despejada de sua casa por falta de pagamento, seja não conseguindo arranjar um emprego ou sendo desprezada por seu filho, que mora com o pai.
A abertura, que lembra algumas características de filmes como Juno, pelos desenhos e pela música alegre “indie”, não nos prepara para o lado mais triste de Elsa, interpretada por Julie Gayet. Mas nos indica a intenção do diretor de não se entregar a um tom dramático ou excessivo.
É um filme bastante simpático. Daqueles que poderiam muito bem estrear um tempo depois nos cinemas e atrair um número significativo de público, principalmente os que gostam de acompanhar o cinema francês. As atuações de Julie e de seu companheiro de tela, Denis Podalydes, estão muito boas e vemos facilmente a química entre os dois.
Ele é outro personagem que está a margem da sociedade. Prestes a ser despejado, também a procura de um emprego, um pouco excêntrico, cujo hobby é tiro ao arco, o personagem de Denis completa a dupla. Quando juntos, potencializam nossa empatia e dão força um ao outro, aliviando nossa tensão e arcando com o tom cômico do filme. Este tom de leveza e tristeza, este equilíbrio entre o riso e o choro é bem estabelecido e mantido ao longo do filme. A trilha sonora é ótima e nos incita a procurá-la para escutá-la mais vezes. Eu, particularmente, gosto de histórias que não cedem a uma visão fatalista dos acontecimentos. Mesmo não sendo um grande filme, é um desses que vou guardar na memória com carinho.

A oeste de Plutão
Fui assistir este filme por recomendação de duas pessoas, uma delas um diretor canadense de Montreal, Denis Coté, que me disse: é um filme pequeno, interessante e extremamente quebecquois (de Quebec – Canadá). Pode até ser que o filme seja um retrato fiel de um grupo de jovens de Quebec, mas como não tenho como fazer comparações por não conhecer este grupo, o que posso dizer é que ele é uma representação muito próxima do que entendo como o mundo da adolescência. Ou seja, se bem que possa expressar um universo particular, atinge também o universal.
Pra reduzir a descrição, digo que é um “Kids” bom. Detesto Kids… acho extremamente pretensioso e tendencioso na representação do adolescente. Já em “A oeste de plutão”, os diretores Henry Bernadet e Myriam Verreault não fetichizam (como Gus Van Sant costuma fazer), nem idealizam, nem demonificam os jovens. Tentam tratá-los com a complexidade que merecem, sem uma visão maniqueísta ou a usual caracterização de juventude perdida e irresponsável.
É um filme simples, filmado de forma simples com um roteiro simples. Um dia na vida de alguns jovens de classe média, entre 15 e 16 anos. Momentos sozinhos e em grupo, situações comuns. Um padrasto que anuncia que vai morar com você e sua mãe, escrever um poema para a menina que nem nota que você existe, jogar videogame com seus amigos, fofocar sobre meninos, ter discussões pseudo intelectuais na quadra de educação física, ensinar como se pega mulher, ensaiar uma música que você compôs, etc, Até chegar no momento auge: a festa na casa da menina com quem todos implicam, que está superlotada porque uma outra que costumava ser sua amiga convidou muito mais gente do que deveria e as consequências dos atos impulsivos que se darão ali.
Conseguimos então ter uma visão geral de suas atividades, inseguranças e motivações, assim como um egoísmo que parece intrínseco a esta idade. Personagens que não se preocupam com a consequência de seus atos, que não pensam antes de agir e principalmente, que fazem qualquer coisa quando em grupo. Viram rebanho a postos para seguir um líder, que nem precisa ser alguém diferenciado. É simplesmente alguém que tomou frente e tomou alguma atitude. Os outros só vão atrás.
E ao mesmo tempo que nos deparamos com essa adolescência inconsequente, vemos também que não se pode reduzi-los a isso. Que são pessoas inseguras, capazes de gentilezas, de reflexão, etc e que estão passando por um turbilhão de emoções.
Enfim, um filme bacana que deveria ser visto não só pelos jovens mas por todos. Quem sabe entendendo melhor uns aos outros, não estabelecemos uma melhor comunicação?

A woman, a gun and a noodleshop
Filme mais recente de Zhang Yimou e inspirado no roteiro original do primeiro longa dos irmãos Cohen, Blood Simple, “A woman…” continua caindo no meu apreço pelo cineasta. Não chega a ser um desastre total, como “A maldição da flor dourada” mas ainda está bem abaixo de “O Herói”, filme com o qual descobri o diretor e o qual me deu curiosidade para procurar trabalhos antigos. Apesar de extremamente conservador em sua mensagem, e quase propaganda política do governo, “O Herói” era um filme sensível que passava de mera estética e truques de efeitos especiais. A história e seus personagens eram envolventes e o desenrolar emocionante, além de um clima lúdico fascinante que permeava a narrativa.
Desde então, este posto de O Diretor propaganda chinês vem lhe custando bastante. “O Clã das adagas voadoras” parecia uma tentativa de continuação de estilo do filme anterior combinando agora um toque mais tradicional de melodrama. Quem pode esquecer as três vezes que Mei, interpretada por Zhang Ziyi, morre no fim? Depois disso veio um filme diferente desta vertente: Um longo caminho, com temática mais simples, sem os efeitos especiais e ambientado na China atual. Excessões a parte, em 2006, Zhang Yimou lança o super melodramático, versão da peça Thunderstorm, de Cao Yu, ambientado durante a Dinastia Tang, “A maldição da flor dourada”. Exagerado em todos os sentidos, a imersão no gênero do melodrama resultou num filme longo e chato.
Finalmente chegamos em a “A woman a gun…”. Seguindo este caminho de cinema que deve agradar e atingir as massas, Zhang Yimou mistura a comédia pastelona e o melodrama, mas não consegue chegar aos pés da versão original da história. Não cria a tensão que os mal entendidos merecem, não gera empatia com nenhum dos personagens, nos tornando distantes e indiferentes ao que lhes ocorre, nem dá o peso necessário ao envolvimento entre os mesmos. O timing entre comédia e melodrama fica muito descompassado e exagerado para ambos os lados, sem que se encontrem no caminho.
Enfim, um filme que pode vir a ser divertido para alguns, mas que pra mim se reduz cada vez mais a estilo e não é bem sucedido em sua tentativa de misturar drama e comédia, tarefa realizada com maestria pelos Cohen Brothers.

Amores Imaginários
Segundo filme do badalado “recente talento descoberto” canadense, Xavier Dolan, “amores imaginários” foi uma decepção pra mim, que esperava um filme mais maduro e mais autoral.
Pensava que na segunda tentativa, Xavier poderia se desvencilhar do estilo exagerado que pega de cineastas como Gus Van Sant, Wong Kar Wai, Christophe Honoré dentre outros e criar algo, mesmo que antropofágico. Mas ao invés disso, ele deixa de lado o que mais apreciei em sua estréia, J’ai tué ma mere: uma explosão de sentimentos, algo de muito pessoal e sincero, que muitas vezes se torna auto indulgente e de extrema arrogancia, mas que em outras mostra a fragilidade e a sensibilidade de Xavier. Eu matei minha mãe foi escrito quando ele ainda tinha 16 anos e realizado quando tinha 18. Agora, após o lançamento do segundo, Xavier está com 21 anos e parece deslumbrado com as possibilidades técnicas que um orçamento maior traz, mais do que qualquer coisa. Ao invés de se aprofundar na honestidade do tema que vai tratar, permanece constantemente na superfície, preenchendo os 95 minutos de filme apenas com câmeras lentas wong karwainianas, closes de rapazes gusvansatianos, luzes coloridas godardianas etc. Creio que 80% do filme é pura estética, se não mais. 80% de câmera lenta, quadros tortos, enquadramentos de quina ou que preenchem um terço da tela, de cenas videoclípticas. Cansativo para aqueles que buscam algum conteúdo.
Reconheço que essa futilidade vai atrair um grande público, que vai se identificar com o estilo, vai achar bonito e sensível, que seja. Mas pra mim, isto que poderia ser um ensaio interessante sobre a rejeição virou um discurso super estetizado de um ainda adolescente mimado. A única diferença é que ele agora mora sozinho.